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domingo, 24 de dezembro de 2023

A PERTINÊNCIA DA FILOSOFIA EM UM MUNDO PÓS-MODERNO: UMA REFLEXÃO PROFUNDA / Impactos na Maçonaria

 

 


 

Por M.´. I.´. Luis Genaro L. Fígoli (Moshe)

Gr.´. 33° REAA

 

Introdução

Na contemporaneidade, o termo "pós-moderno" muitas vezes é associado à desconstrução de estruturas tradicionais, desafiando a filosofia a repensar suas premissas fundamentais. A questão sobre a viabilidade da filosofia em um mundo pós-moderno não apenas convoca uma reflexão superficial, mas demanda uma imersão nas raízes da disciplina e uma exploração mais profunda das maneiras pelas quais ela pode responder aos desafios de um cenário em constante metamorfose.

 

A Filosofia Diante da Desconstrução Pós-Moderna: Uma Reconfiguração Necessária

A desconstrução pós-moderna, marcada pela crítica às grandes narrativas, instiga a filosofia a abandonar suas certezas e abraçar a fluidez do pensamento. Jacques Derrida, um dos arquitetos dessa desconstrução, propõe que a filosofia não se trata de encontrar respostas definitivas, mas de explorar as complexidades inerentes às estruturas conceituais. Assim, em vez de debilitar a filosofia, a desconstrução pós-moderna a desafia a se reinventar, tornando-se uma disciplina mais flexível e sensível às nuances da experiência humana.

 

A Filosofia como Diálogo Intercultural: Reconhecendo a Polifonia de Vozes Filosóficas

A crítica pós-moderna à filosofia tradicional, muitas vezes acusada de eurocentrismo, aponta para a necessidade de uma abordagem mais inclusiva. A proposta de um diálogo intercultural, conforme delineado por pensadores como Kwame Anthony Appiah, impulsiona a filosofia para além das fronteiras geográficas e culturais. Ao permitir que diversas tradições filosóficas dialoguem, a filosofia pós-moderna se torna um terreno fértil para a criação de um conhecimento enriquecido, tecido a partir das múltiplas perspectivas que compõem a tessitura da experiência humana.

 

A Filosofia e a Ética da Responsabilidade: Pensando Além do Indivíduo

Hans Jonas, ao formular a "Ética da Responsabilidade", propõe uma abordagem ética que transcende o individualismo, considerando as implicações a longo prazo de nossas ações. Em um mundo pós-moderno, onde as ramificações éticas se estendem por fronteiras e escalas globais, a filosofia pode desempenhar um papel crucial na promoção de uma ética coletiva. A filosofia pós-moderna não apenas nos convida a refletir sobre nossas ações, mas a considerar o impacto ético de sistemas complexos e interconectados, chamando-nos a uma responsabilidade mais ampla e consciente.

 

A Filosofia e a Busca por Sentido em um Mundo Fragmentado: Um Convite à Autenticidade Existencial

Jean-Paul Sartre, ao afirmar a condenação à liberdade, destaca a responsabilidade de criar significado em um mundo aparentemente desprovido de sentido intrínseco. Em um contexto pós-moderno, onde as estruturas se tradicionais de significado podem parecer frágeis, a filosofia se torna uma bússola para a busca existencial. Ao invés de oferecer respostas prontas, a filosofia pós-moderna capacita os indivíduos a se envolverem na construção ativa de significado, promovendo uma autenticidade existencial que transcende as limitações das metanarrativas.

 A questão sobre a relevância da filosofia em um mundo pós-moderno não sugere a sua obsolescência, mas sim a necessidade premente de uma abordagem mais aprofundada e adaptativa. A filosofia, longe de ser uma disciplina estática, revela-se como um campo de exploração incessante diante da complexidade do mundo contemporâneo. Ao se reinventar em resposta às demandas da desconstrução, ao abraçar a diversidade cultural, ao promover uma ética da responsabilidade e ao incentivar a busca autêntica por sentido, a filosofia pós-moderna emerge como uma ferramenta vital para a compreensão e a orientação em um universo em constante transformação. Assim, ao invés de se render à incerteza, a filosofia posiciona como um farol, iluminando os caminhos da reflexão crítica e da busca pela compreensão mais profunda.

Em última análise, a pergunta sobre a possibilidade da filosofia em um mundo pós-moderno não deve ser vista como uma sentença de morte para a disciplina, mas como um convite para uma renovação profunda. Ao abraçar a incerteza, reconhecer a diversidade de perspectivas e abordar questões éticas complexas, a filosofia pode não apenas sobreviver, mas também florescer em um mundo pós-moderno. Ela se torna não apenas uma busca por respostas definitivas, mas um processo contínuo de reflexão, diálogo e engajamento crítico com as complexidades do mundo contemporâneo. A filosofia persiste como uma ferramenta essencial para compreender, questionar e dar sentido ao nosso lugar neste vasto e multifacetado universo pós-moderno.

 

E na Maçonaria?

As assertivas acima servem também para a Maçonaria. Muito embora seu modelo filosófico rígido, baseado em Rituais produzidos nos séculos XVII e XVIII no seu primeiro processo de revisionismo[1] .Um exemplo notável de revisão na maçonaria ocorreu durante o período conhecido como a "Era da Iluminação" nos séculos XVII e XVIII na Europa. Durante esse tempo, alguns maçons e intelectuais influentes buscaram promover ideias iluministas, como a razão, a liberdade e a igualdade, dentro dos círculos maçônicos. A maçonaria, que já tinha uma tradição de tolerância religiosa e busca pelo conhecimento, encontrou espaço para incorporar ideias iluministas em sua filosofia.

 Além disso, ao longo dos anos, diferentes correntes e movimentos dentro da maçonaria podem ter defendido revisões em seus rituais ou filosofia para se adaptar às mudanças culturais e intelectuais.

O mais recente revisionismo ocorreu no século XIX, pelo advogado, militar, maçom e escritor dos Estados Unidos, Albert Pike[2]. Em 1855 começou a organizar o Rito Escocês e terminou o trabalho em apenas dois anos, em 1857. O trabalho foi visto como perigosamente rápido e pediu-se que ele levasse mais tempo, revendo o ritual. Mas o empenho garantiu que ele fosse investido do grau 33 em 1858 e um ano depois foi eleito Soberano Grande Comendador da jurisdição do sul do Rito Escocês em 1859. A revisão do rito foi interrompida pela Guerra Civil Americana, além disso o Supremo Conselho, que tinha sede em Charleston, mudou sua sede para Washington, DC em 1870. Em 1871 publica seus estudos sobre todos os graus do Rito Escocês no livro intitulado Moral e Dogma do Rito Escocês Antigo e Aceito da Maçonaria, ou simplesmente Moral e Dogma, tendo tido várias revisões e republicações até a edição oficial definitiva, em 1884. A implantação pratica dos estudos foi executada de imediato servindo até para outros Supremos Conselhos.

O século XXI, em especial com o avanço da ciência, a IA, a mudança de comportamento da sociedade, as alterações nos princípios e valores do ser humano, vão trazer (não tenho dúvida), uma necessidade de revisão da filosofia maçônica (mantidos os princípios basilares de moral e ética), mas em especial no que se refere à forma como transmitimos a docência maçônica em nossas Lojas. A queda de membros na América do Norte e na Europa atesta o desinteresse (talvez) das pessoas em relação à Ordem, pela multiplicação de informações (e até revelação) dos seus segredos na internet.

Uma simples consulta ao Google com o termo “Maçonaria”, traz 6.180.000[3] páginas com informações sobre o tema. Uma das primeiras páginas traz o indefectível título “Fique por dentro dos segredos da Maçonaria” (não vou colocar o link por razões óbvias) desfilando uma série de informações sobre a Ordem. Se procurar um pouco mais, lá estão t.´. s.´. e p.´. que são os verdadeiros segredos que deveriam ter ficado à c.´. dentro de uma Loj.´..

Tenho mais de 30 anos na Ordem. Ultimamente tenho feito este debate com II.´. e em geral os mesmos são refratários em relação ao tema. Não acham que a modernidade possa afetar a Ordem, já que ela preexiste há mais de 300 anos (como Instituição formal) e já passou por vários momentos difíceis como na época da Inquisição, na implantação do Comunismo e na ascensão do Nazismo e Fascismo com a Segunda Grande Guerra. Também sofreu (em menor medida) com a Monarquia na Europa do século XVII e XVIII, sendo que, no Brasil, foi proibida em 1808 quando da vinda do Imperador “carola” Dom João VI. Em 1822 foi permitido o seu funcionamento até ser proibida novamente por Dom Pedro (após ter sido iniciado, recebido os 33 graus e ter sido eleito Gr.´. M.´.).

Enfim, mantenho aberta esta discussão que me parece sadia e importante para o futuro de nossa Ordem. Como somos livres pensadores, as mudanças só ocorrerão se a maioria dos II.´. estiverem de acordo.

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Bibliografia Sugerida:

1.       Jacques Derrida:

"A Gramatologia"

"A Desconstrução na Filosofia Contemporânea"

2.     Kwame Anthony Appiah:

"Coso Cosmopolitanism: Ethics in a World of Strangers"

"In My Father's House: Africa in the Philosophy of Culture"

3.     Hans Jonas:

"O Princípio Responsabilidade: Ensaio de uma Ética para a Civilização Tecnológica"

"The Imperative of Responsibility: In Search of an Ethics for the Technological Age"

4.     Jean-Paul Sartre:

"O Ser e a Nada"

"Existencialismo é um Humanismo"

5.     Michel Foucault:

"Vigiar e Punir"

"Microfísica do Poder"

6.     Jean-François Lyotard:

"A Condição Pós-Moderna"

"O Inumano: Considerações sobre o Tempo"



[1] Na maçonaria, o termo "revisionismo" pode se referir a tentativas de reinterpretar ou reformular certos aspectos dos rituais, símbolos ou filosofia maçônica. Essas tentativas podem ter origens diversas e serem influenciadas por mudanças culturais, sociais, filosóficas ou mesmo políticas.

[2] Albert Pike (29 de dezembro de 1809, Boston — 2 de Abril de 1891, Washington).

[3] Consulta feita em 24/12/2023



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sábado, 28 de outubro de 2023

Somos Todos uma Obra Inédita e Inacabada – Uma perspectiva da obra de Sartre e de Erikson

 

Somos Todos uma Obra Inédita e Inacabada – Uma perspectiva da obra de Sartre e de Erikson

 “Somos condenados a ser livres.”

Jean-Paul Sartre

Por M.´. I.´. Luis Genaro L. Figoli (Moshe)

Grau 33° REAA

 


 Introdução

A ideia de que somos todos uma obra inédita e inacabada é profundamente filosófica e existencial, colocando em questão a natureza humana e nossa busca constante pela autenticidade e pelo desenvolvimento pessoal. Neste artigo, exploraremos essa concepção, analisando-a a partir de perspectivas filosóficas e psicológicas. Vamos abordar a obra "O Ser e o Nada" de Jean-Paul Sartre[1], bem como as teorias do desenvolvimento humano de Erik Erikson, para lançar luz sobre essa fascinante ideia.

 

A Perspectiva Existencialista de Jean-Paul Sartre

O filósofo existencialista Jean-Paul Sartre, em sua obra "O Ser e o Nada", argumentou que somos todos, obras inéditas e inacabadas devido à nossa capacidade de escolher e definir nossa própria existência. Sartre introduziu o conceito de "liberdade radical", que sugere que somos completamente livres para escolher o que fazemos e quem queremos ser. Essa liberdade implica uma responsabilidade esmagadora, pois somos os únicos responsáveis por nossas escolhas e ações.

Para Sartre, a inacabamento da existência humana está intrinsecamente ligada à nossa liberdade de escolher nossos valores, objetivos e identidades. Cada escolha que fazemos molda nossa existência de uma maneira única e imprevisível, tornando-nos obras inacabadas que estão constantemente em processo de se definir. Isso implica que nunca alcançamos um estado final ou uma identidade fixa, pois estamos em constante evolução.

 

Desenvolvimento Humano e Identidade

Erik Erikson[2], psicólogo do desenvolvimento, abordou a questão da identidade ao longo da vida em sua teoria das crises psicossociais. De acordo com Erikson, a vida é uma série de estágios, cada um com uma crise específica que deve ser resolvida para alcançar um desenvolvimento saudável. Essas crises estão relacionadas à identidade e ao processo de se tornar uma pessoa única e autêntica.

Em seu estágio de adolescência, Erikson discute a "crise da identidade versus confusão de papéis". Neste período, os jovens exploram diferentes identidades e papéis, e a resolução bem-sucedida dessa crise leva a uma identidade sólida e um senso de si mesmo. No entanto, essa identidade está longe de ser fixa, pois continuamos a nos desenvolver e evoluir ao longo da vida.

 

Implicações para a Autenticidade e o Crescimento Pessoal

A ideia de que somos obras inéditas e inacabadas tem implicações significativas para nossa busca pela autenticidade e crescimento pessoal. Ela nos lembra que a mudança e a evolução são partes intrínsecas da experiência humana. Portanto, não devemos temer a mudança, mas sim abraçá-la como uma oportunidade para nos tornarmos mais autênticos e alinhados com nossos valores.

Além disso, a noção de que somos obras inacabadas nos encoraja a abraçar a incerteza e a explorar diferentes aspectos de nossa identidade ao longo da vida. Isso nos permite experimentar, aprender e crescer, em vez de nos prendermos a uma identidade rígida que não reflita mais quem somos.

 

A Natureza Complexa da Identidade

Nossa identidade é uma construção complexa que abrange uma variedade de aspectos, incluindo nossa personalidade, valores, crenças, experiências de vida e relacionamentos. Cada um desses elementos contribui para quem somos, e todos estão em constante evolução. Isso significa que, ao longo de nossas vidas, estamos continuamente adicionando novos capítulos à nossa história pessoal.

A perspectiva existencialista de Sartre e a teoria das crises psicossociais de Erikson destacam a importância da autenticidade na formação de nossa identidade. Sartre argumenta que a autenticidade está intrinsecamente ligada à liberdade de escolher nossos valores e ações. Ser autêntico significa assumir a responsabilidade por nossas escolhas e viver de acordo com nossos valores, mesmo quando isso implica confrontar a angústia existencial que pode surgir.

Erikson, por sua vez, enfatiza a importância de encontrar um senso de identidade verdadeira ao longo da vida. Cada estágio de desenvolvimento traz novas oportunidades e desafios para explorar e desenvolver nossa identidade, desde a infância até a velhice. Isso ilustra a ideia de que a identidade é uma jornada contínua, com cada estágio oferecendo a oportunidade de revisitar e redefinir quem somos.

 

A Influência da Sociedade e da Cultura

Além dos fatores individuais, a sociedade e a cultura desempenham um papel fundamental na formação de nossa identidade. A sociedade fornece uma estrutura na qual desenvolvemos nossos papéis sociais, nossa moral e nossas crenças. No entanto, essa influência externa nem sempre está alinhada com nossa busca por autenticidade.

A pressão social, as expectativas culturais e as normas podem criar conflitos internos, desafiando nossa capacidade de ser autênticos. Portanto, a jornada para se tornar uma obra inédita e inacabada envolve muitas vezes reconciliar as influências externas com nossos valores e desejos internos. Isso exige uma constante reflexão e autoconhecimento para determinar qual parte de nossa identidade é verdadeiramente nossa e qual parte é moldada pela sociedade.

 

Resiliência e Crescimento

Uma obra inédita e inacabada implica uma abordagem de crescimento contínuo e resiliência. Aceitar que somos inacabados nos dá permissão para cometer erros, aprender com eles e crescer. Essa abordagem nos ajuda a superar desafios e adversidades, pois reconhecemos que somos capazes de nos adaptar e evoluir.

A noção de inacabamento também nos incentiva a buscar novas experiências e oportunidades de aprendizado. A vida está cheia de possibilidades, e cada experiência pode contribuir para nossa jornada de autodescoberta. A exploração de novos horizontes, a exposição a diferentes perspectivas e o desenvolvimento de novas habilidades contribuem para enriquecer nossa identidade e torná-la mais completa.

Conclusão

A ideia de que somos todos uma obra inédita e inacabada é uma reflexão profunda sobre a natureza humana e a busca pela autenticidade. Jean-Paul Sartre nos lembra que somos livres para escolher nossas identidades e que cada escolha que fazemos nos molda de maneira única. Erik Erikson adiciona que o desenvolvimento da identidade é um processo contínuo ao longo da vida. Essas perspectivas nos encorajam a abraçar a mudança e a explorar nossa identidade em constante evolução.

Em última análise, somos obras inacabadas que estão sempre em processo de se definir. Devemos abraçar essa jornada e aproveitar a oportunidade de crescer, evoluir e buscar a autenticidade em nossas vidas.

 

Referências Bibliográficas:

Sartre, Jean-Paul. (1943). "O Ser e o Nada." Editora Vozes.

Erikson, Erik H. (1968). "Identidade: Juventude e Crise." Editora Artes Médicas.



[1] Jean-Paul Charles Aymard Sartre (Paris, 21 de junho de 1905 – Paris, 15 de abril de 1980) foi um filósofo, escritor e crítico francês, conhecido como representante do existencialismo. Acreditava que os intelectuais têm de desempenhar um papel ativo na sociedade. Era um artista militante, e apoiou causas políticas de esquerda com a sua vida e a sua obra. Repeliu as distinções e as funções problemáticas e, por estes motivos, se recusou a receber o Nobel de Literatura de 1964.[2] Sua filosofia dizia que no caso humano (e só no caso humano) a existência precede a essência, pois o homem primeiro existe, depois se define, enquanto todas as outras coisas são o que são, sem se definir, e por isso sem ter uma "essência" que suceda à existência.[3] Ele também é conhecido por seu relacionamento aberto que durou cerca de 51 anos (até sua morte) com a filósofa e escritora francesa Simone de Beauvoir.

[2] Erik Homburger Erikson (Frankfurt, 15 de junho de 1902 — Harwich, 12 de maio de 1994) foi um psicólogo do desenvolvimento e psicanalista alemão-americano conhecido por sua teoria sobre o desenvolvimento psicológico dos seres humanos. Ele cunhou a expressão crise de identidade. Apesar de não ter diploma universitário, Erikson atuou como professor em instituições proeminentes, incluindo Harvard, Universidade da Califórnia, Berkeley, e Yale. Uma pesquisa da Review of General Psychology, publicada em 2002, classificou Erikson como o 12º psicólogo mais eminente do século XX.

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