Por: Luis Genaro L. Fígoli (Mestre Moshe 33°)
A Vida: Entre a Causa Perdida e a Oportunidade (Ampliado)
A vida é, paradoxalmente, o mais profundo mistério e o mais cotidiano dos fenômenos. A cada instante, somos confrontados com a sua fragilidade e transitoriedade, mas também com o seu brilho fugaz – aquele que nos convida a explorá-la, a encontrar significados, a criar. Pensar a vida como uma "causa perdida" ou como uma "oportunidade" é enfrentar a própria condição humana: somos seres conscientes da nossa finitude, mas, ao mesmo tempo, desejosos de transcendê-la. Essa tensão é o motor de muitas das reflexões filosóficas mais profundas.
A vida como causa perdida: a sombra da morte
A morte é a única certeza que carregamos desde que nascemos. Para alguns, isso basta para declarar a vida como uma causa perdida. Afinal, para que nos esforçarmos, amarmos ou construirmos, se tudo será apagado pela passagem do tempo? Essa visão, por vezes associada ao niilismo, foi explorada por filósofos como Arthur Schopenhauer, que via a existência como um ciclo de desejos insaciáveis e sofrimentos inevitáveis. Para ele, viver era ser arrastado por uma força cega e irracional – a "vontade de viver" – que nos condenava ao desespero.
No entanto, mesmo Schopenhauer encontrava alguma beleza na contemplação estética. A arte, para ele, era um refúgio da dor da existência, um momento em que podíamos nos libertar temporariamente da tirania da vontade. Assim, mesmo na visão mais pessimista da vida, há espaço para algo que transcenda a pura negatividade.
Por outro lado, filósofos contemporâneos como Martin Heidegger ampliaram essa ideia, argumentando que a morte não é apenas um fim, mas uma presença constante na vida. Em sua obra Ser e Tempo, Heidegger descreve o ser humano como um "ser-para-a-morte". Isso não significa que vivemos obcecados pela morte, mas que ela é o horizonte último que dá sentido às nossas escolhas. A consciência da finitude não nos paralisa, mas nos desperta para a urgência de viver autenticamente.
A vida como oportunidade: a celebração da existência
Se a morte é inevitável, a vida, em contrapartida, é uma oportunidade única. Muitos filósofos e pensadores encontraram na transitoriedade da vida uma razão para celebrá-la. Friedrich Nietzsche, por exemplo, rejeitava o pessimismo de Schopenhauer e colocava a vida como algo que deve ser afirmado em toda a sua complexidade. Sua ideia do "amor fati" – o amor ao destino – nos convida a aceitar tudo o que a vida traz, tanto as alegrias quanto os sofrimentos, como partes intrínsecas de uma existência plena.
Nietzsche propôs o conceito do eterno retorno, uma ideia hipotética segundo a qual cada momento da nossa vida se repetiria infinitamente. Para ele, a verdadeira medida de uma vida bem vivida seria a capacidade de desejar que ela fosse repetida da mesma forma, eternamente. Essa visão nos desafia a viver com intensidade, a aproveitar cada instante como se fosse eterno.
Outro exemplo é Albert Camus, que, ao refletir sobre o absurdo da existência, encontrou um sentido paradoxal na própria falta de sentido. Em O Mito de Sísifo, Camus afirma que, embora a vida não tenha um propósito intrínseco, ela pode ser vivida plenamente ao abraçarmos o absurdo. A imagem de Sísifo, condenado a rolar eternamente uma pedra montanha acima, não é a de um homem derrotado, mas de alguém que encontra alegria no próprio esforço. Para Camus, "a luta para alcançar o cume é suficiente para preencher o coração de um homem".
Os ciclos da vida: equilíbrio entre perda e renovação
A vida é marcada por ciclos: nascimento e morte, crescimento e decadência, começos e fins. Esses ciclos nos lembram que a existência é impermanente, mas também cheia de renascimentos. O filósofo estoico Marco Aurélio refletia sobre essa natureza cíclica da vida em suas Meditações, observando que tudo na natureza segue um fluxo. Para ele, aceitar esse fluxo era a chave para viver com tranquilidade e sabedoria. "Tudo o que acontece é tão natural quanto as flores que desabrocham na primavera e as folhas que caem no outono", escreveu.
Essa percepção também aparece nas tradições orientais, como no budismo. O conceito de impermanência (ou anicca) é central na filosofia budista, que nos ensina a aceitar que tudo na vida é transitório. A dor, a alegria, as perdas e os ganhos – todos passam. No entanto, essa impermanência não deve ser motivo de tristeza, mas de gratidão. Cada momento é único precisamente porque é passageiro.
A alegria como resistência
Como, então, encontrar alegria em meio à transitoriedade e à certeza da morte? A resposta pode estar na forma como vivemos o presente. A alegria, nesse sentido, não é um estado permanente, mas uma atitude, um modo de estar no mundo. Viktor Frankl, psiquiatra e sobrevivente do Holocausto, descreveu em Em Busca de Sentido como, mesmo nas condições mais extremas, o ser humano pode encontrar sentido e beleza. Para Frankl, o sentido da vida não é algo dado, mas algo que criamos, mesmo nas situações mais adversas.
Além disso, a alegria pode ser vista como uma forma de resistência. Em um mundo marcado pela fragilidade e pela incerteza, celebrar a vida é um ato de coragem. É o que nos ensina o poeta Fernando Pessoa, quando diz: "Tudo vale a pena, se a alma não é pequena." A vida, com todos os seus desafios, ainda é um presente incomensurável.
A vida como paradoxo: causa perdida e oportunidade
No fundo, a vida é simultaneamente uma causa perdida e uma oportunidade. É perdida porque sabemos que terá um fim, mas é uma oportunidade porque, enquanto dura, podemos preenchê-la com significado. Essa dualidade é o que torna a existência tão rica e fascinante. Como escreveu o filósofo francês Blaise Pascal: "O homem não é nem anjo nem besta, mas algo entre os dois." Vivemos divididos entre a nossa fragilidade e a nossa capacidade de transcendê-la.
Talvez, portanto, a melhor maneira de viver seja aceitar esse paradoxo. Não precisamos escolher entre a causa perdida e a oportunidade – podemos abraçar ambos. A morte, longe de ser um inimigo, pode ser um lembrete constante de que cada momento conta, de que cada encontro é precioso, de que cada dia é uma chance de recomeçar. Afinal, como disse o poeta Mario Quintana: "A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa."
E que tarefa mais nobre poderíamos desejar?
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