sexta-feira, 3 de janeiro de 2025

“ATRAVÉS DE UMA PALMEIRA, EU VI O SOL POENTE”

 

Crônica

Por: M.´.I.´. Luis Genaro L. Fígoli

33°

O dia já findava quando parei sob a sombra da palmeira. O céu tingia-se de laranja e púrpura, e o sol, em sua descida majestosa, refletia sobre minhas retinas uma beleza que, por mais que tentasse, jamais poderia capturar em palavras. Ali, em meio ao silêncio e ao vento que balançava as folhas, percebi o quanto tudo é transitório — o sol que se põe, o vento que sopra, as folhas que caem. A vida, afinal, é feita de ciclos, e cada momento que vivemos é ao mesmo tempo o início e o fim de algo.

Lembrei-me de Heráclito, o filósofo do devir, que dizia: “Nenhum homem entra no mesmo rio duas vezes, pois o rio não é o mesmo, assim como o homem já não é o mesmo”. Naquele instante, fui tomado por um sentimento agridoce. O sol poente era o mesmo que eu vira no dia anterior, mas não era. Aquele momento era único, irrepetível, e, como tudo na vida, passaria.

A palmeira, imóvel na sua altura serena, parecia ser testemunha de algo maior. Quantos sóis já haviam se posto sob seus galhos? Quantas pessoas haviam passado, olhado para ela e seguido seus caminhos? Talvez nem a palmeira fosse eterna. Talvez, no seu tempo, ela também estivesse cumprindo seu ciclo, vivendo um dia de cada vez, sem pressa, sem angústia, apenas existindo.

É curioso como buscamos controlar o incontrolável. Fazemos planos para o futuro, tememos o que virá, lamentamos o que passou. Mas, como disse o poeta Horácio em seus versos imortais: “Carpe diem, quam minimum credula postero” — colha o dia, confiando o mínimo possível no amanhã. Não se trata de ignorar o futuro, mas de viver o presente com intensidade e consciência, pois ele é tudo o que temos.

O sol, agora quase completamente escondido no horizonte, parecia sussurrar uma verdade universal: tudo começa e tudo acaba. Há beleza na transitoriedade. Se a vida fosse eterna, talvez perdêssemos a capacidade de enxergar a preciosidade de cada instante. É o fim que dá sentido ao começo. É o efêmero que torna cada momento sagrado.

Lembrei-me também de Fernando Pessoa, que, em sua prosa poética, escreveu: “Tudo vale a pena se a alma não é pequena.” Talvez viver bem seja isso: aceitar os ciclos, acolher o que vem, deixar partir o que se vai, e, principalmente, permitir-se sentir. Porque, no fundo, viver não é sobre acumular coisas ou momentos, mas sobre estar presente.

Enquanto o céu escurecia e a primeira estrela surgia, senti uma paz profunda. A palmeira continuava ali, imóvel, como um guardião do tempo. O sol havia desaparecido, mas eu sabia que ele voltaria. Assim como tudo na vida — o que vai, volta; o que morre, renasce. E, nesse eterno ciclo de começos e fins, cabe a nós apenas viver, um dia de cada vez, com o coração aberto para o que vier.

 

Bibliografia

Heráclito. Fragmentos. Tradução de Gerd Bornheim. Editora Vozes.

Horácio. Odes. Tradução de J. A. de Carvalho. Editora Martins Fontes.

Pessoa, Fernando. Livro do Desassossego. Organização de Richard Zenith. Companhia das Letras.

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