Por Irm.´. Luis Genaro (Moshe) M.´.I.´.
Na Maçonaria história e lenda se confundem. O limite entre o que é fato histórico e o que é lenda, nem sempre é perfeitamente delimitado para o estudioso da Maçonaria, trazendo aos menos especializados, dúvidas e equívocos que acabam se perpetuando.
Não podemos esquecer, que na Maçonaria e nas Ordens Iniciáticas secretas (ou discretas como é a Maçonaria), todas simbólicas, o conhecimento se transmite, em grande parte, através da tradição oral. Se houver um erro de um determinado fato histórico, um excesso, ou uma deformação histórica, ela tende a se perpetuar entre seus adeptos.
Não é difícil encontrar Maçons que defendem a ideia que o primeiro maçom foi Adão (o homem primevo segundo a Bíblia), ou que Jesus teria sido o fundador da Maçonaria, de que a Maçonaria teria surgido durante o Império do Antigo Egito, de que Pitágoras teria sido um dos principais ícones da Maçonaria antiga, etc. Há os que afirmem que a Maçonaria está ligada diretamente à Criação do Universo. Nestas afirmações, não há nenhuma fundamentação histórica, baseada em fato histórico científico, perdendo-se completamente em “atos de fé” ou de deformações no conhecimento sobre as verdadeiras origens da Ordem.
Todo “ato de fé” é traduzido num Dogma. E dogma (ou a presença dele) é a característica mais comum de uma Religião. A Maçonaria propugna não ser uma Religião (embora tenha religiosidade) e, portanto, não pode ser defensora de dogmas, sejam eles quais forem. Como temos uma Crença comum (da existência de um principio Criador que denominamos Grande Arquiteto do Universo) e devido as grandes influências da Igreja Católica e da religião Hebraica (ligado às origens da Maçonaria que se desenvolvera paralelamente ao Cristianismo, principalmente no final da Idade Média e na Idade Moderna), existem elementos comuns que podem confundir os menos estudiosos.
Mais complexo (e não menos polêmico) é a história sobre a Construção do Templo de Salomão e a Lenda de Hiram, que é a coluna vertebral da Maçonaria, principalmente nos Graus Simbólicos. O que se sabe sobre a construção do Templo, é que consta na Bíblia, no 3° Livro de Reis (Primeiro Reis) Capítulos 5 a 9 . Não há registros históricos da Construção deste Templo, em nenhum dos documentos originados pelas diversas sociedades da época (como por exemplo o Antigo Egito, o Império Chinês, Hindu, nem nos outras populações que residiam na Terra naquele período). Não foram encontrados registros arqueológicos do Templo de Salomão (que segundo a própria Bíblia teria sido destruído e reconstruído 3 vezes). Restaram apenas, ruínas do que fora o Templo de Herodes que, segundo a histografia, poderia ter sido construído no mesmo lugar onde teria existido o famoso Templo do Rei Sábio. Se o Templo de Salomão é uma dúvida razoável, a saga de Hiram é uma Lenda. Nem na Bíblia encontramos o desenrolar da estória que se conta na Maçonaria. Isso sem considerar o aprofundamento que se faz, nas instruções dos Graus chamados filosóficos. Mas este é um assunto para outro artigo.
Importante para o estudioso na Maçonaria é separar o que é fato histórico, lenda, invencionice, fenomenologia e anacronismo.
O Historiador trabalha com hipóteses, coisas que, em última instância não deixam de serem especulações, mas, mesmo assim, ele faz sobre essas especulações uma análise dialética, ou seja, baseada em proposições e contra proposições, que torna o que é Histórico impossível de ser construído sem um elevado grau de abstração. Busco e defendo que a abstração é científica, existe até uma metodologia de trabalho baseada nela.
Chama-se Fenomenologia. Uma metodologia segundo a qual não existe uma verdade definitiva, todos os fatos só existem quando acontecem, mas é impossível retrata-los tal como eles realmente são, pois toda e qualquer tentativa de fazê-lo será apenas mais uma interpretação e, como tal, extremamente parcial, baseada em juízos de valores e características individuais que, como o nome diz, são diferentes em cada um. Sendo assim, duas interpretações de um mesmo fato não serão iguais nem mesmo se forem dadas por duas testemunhas oculares.
Ninguém pode negar que, em sua época, Platão foi um cientista, no entanto, ele não se baseava em fatos comprovados ou mesmo em documentos totalmente dignos de credibilidade. Mesmo assim, até hoje não ficou comprovado que ele tenha inventado nada, nem mesmo a História de Atlântida, afinal ele a atribuí a Sólon, o famoso político grego. O que Platão fazia então? Ele abstraía em cima de acontecimentos que presenciava ou dos quais tomava conhecimento. Suas abstrações foram tão brilhantes que ele iniciou uma corrente de pensamento tão forte que até hoje é tida como válida. Agora vejamos. Se Platão podia faz Ciência através, única e exclusivamente, da abstração, porque nós também não podemos?
Temos que ter em mente que nossas concepções pessoais estão e sempre estarão envolvidas em tudo o que escrevermos, dissermos ou pensarmos, mas não podemos deixar que elas (que são os nossos paradigmas) nos retirem do eixo que deve ser o fundamental de cada trabalho sério e, sendo assim, científico: a busca da verdade.
A busca da verdade é ingrata, pois por mais que a busquemos, tudo o que encontraremos será nossa própria construção do que é real.
Um erro comum para quem estuda a história é o anacronismo. O anacronismo é o ato de se atribuir coisas de um tempo a outro, de se colocar um costume, uma organização, uma arma, um pensamento... Em um tempo que não é o dela. Em geral o anacronismo se dá em relação a tempos mais remotos, por exemplo, é comum se acreditar que Roma foi sempre um Império, que sempre teve um Imperador, afinal, sempre ouvimos falar de César, do Império Romano, mas isso é uma inverdade, o Império Romano só pode ser considerado como iniciado em 27 a.C., quando Otávio é considerado Augusto, ou ainda, em 14 d.C., quando depois de sua morte, Tibérius assume como o primeiro Imperador
Romano, visto que Augusto é considerado pela historiografia como Príncipe, mas não como imperador. Depois dessa explicação, pode-se constatar uma coisa, Júlio César, o famoso César de Roma, aquele que enfrenta Asterix e Obelix em suas histórias, nunca foi Imperador, ele era apenas um dos Cônsules da Roma Republicana, e sendo assim, anterior ao nascimento do Império. Considera-lo Imperador seria um anacronismo.
Muitas conclusões de Maçons em trabalhos apresentados (inclusive em Livros e Artigos) estão baseadas em anacronismos. Em algumas ocasiões, estes anacronismos se revelaram e se incorporaram em nossos Rituais, modificando o fundamento inicial dos mesmos, alterando, logicamente, o significado e interpretação original. Neste sentido, podemos citar a questão do uso do bastão, o uso da Bíblia, o acendimento das luzes (no REAA), o uso de sinos ou sinetas, a incorporação de uma harmonia (música) sacra e religiosa, etc.
Tudo na Maçonaria é simbólico. Mas é muito importante que possamos resgatar os conceitos originais, reestabelecer a verdade histórica, retirar de nossos estudos e rituais àquilo que represente anacronismos, como forma de ficar mais claro para os neófitos e para todos os Maçons, qual a Verdade (que é o principal objetivo de nossa busca dentro da Ordem). A tese de que todos nos temos uma interpretação sobre a Verdade (fenomenologia) não impede que tenhamos a condição de “depurar” o conhecimento para que as nevoas da ignorância se dissipem com mais facilidade. Clique para ler mais...